Em dias de pouco pulso, que nos sentimos a bater quase nada e que não nos descobrimos ou que não desejamos o nosso próprio encontro, estas personagens - os caminheiros dos trilhos insondáveis - são um verdadeiro bálsamo. Com tão pouco, contam-nos histórias de vida, ilusões, desilusões, reminiscências, minudências, pentelhos. Ao ouvi-los não só conseguimos discordar de nós próprios como, ainda por cima, nos confortamos por causa disso. Tontos de nós. E deles.
Sou pouco sensível a alaridos de qualquer espécie no sentido de me levarem a embarcar em 'manifestações' ao sabor da corrente. Mas sou sensível aos alaridos na perspectiva de oportunidade de ir mais fundo no meu lado de dentro.
ResponderEliminarPor isso, entendo que não deve ser tudo metido no mesmo saco. E foi por este motivo que ontem entendi contar a minha experiência no meu espaço, a qual reproduzo:
Em fuga
Durante o almoço de ontem, a televisão do restaurante debitava informação sobre um trabalho - reportagem, será? - que iria mostrar o que algumas pessoas levariam numa mochila, caso fossem confrontadas com a situação de refugiados de guerra. Apresentaram dois ou três excertos de entrevistas.
Não sei exactamente do que se trata e ainda não fui averiguar porque não condiciona o que pretendo dizer sobre o assunto.
Comentários nas mesas contíguas aludiam a considerações sobre o essencial, nas quais ouvi críticas acerca do livro ou de fotos que se pretendia levar, entre outros pertences, argumentando que não se tratava de bens essenciais.
Tal levou-me a pensar mais no que é essencial e no que é dispensável, e se existem separadores que valham assim tanto a pena fixar.
Digo que me levou a pensar mais porque, devido a circunstâncias pessoais, que há uns anos, junto à porta de entrada da minha casa, tenho uma pequena mochila preparada.
Nesse saco existe o seguinte:
- medicamentos que tomo diariamente (de vez em quando verifico a validade)
- uma garrafa de água
- três cadernos
- cinco esferográficas de tinta preta
- uma lista em papel com o nome das minhas pessoas e respectivos contactos (para o caso de não poder aceder ao que está nos dispositivos electrónicos)
- uma folha com a indicação para juntar telemóvel, portátil pequenino e respectivos carregadores (se tiver tempo). Fica a nota que estas máquinas não têm fotos armazenadas.
Se formos pela definição do indispensável como algo imprescindível para viver, provavelmente no meu saco não está lá nada que se encaixe nessa categoria.
Mesmo no que respeita aos medicamentos, não é expectável que a suspensão da toma durante alguns dias me leve à morte a muito curto prazo. E água é previsível que não se demore muito para arranjar.
Já me interrogaram sobre os motivos de querer levar cadernos e canetas, uma vez que não terei possibilidades de enviar correspondência. Pois, não é para isso. É para escrever sobre o que me rodeia e o que sinto. É um escrever de necessidade que não tem destinatário definido.
Pelo que disse, e que até não é um exercício novo para mim, não encontro motivos que justifiquem criticas e brincadeiras frias sobre a importância do material seleccionado.
Parece-me que as razões da escolha são mais de ordem emocional e relacionadas com a forma como presumimos que ocuparíamos os tempos vazios. se pudéssemos, e tendo em conta os condicionalismos.
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Bom dia, Impontual!
Abraço
Isabel Pires, como deve calcular não escrevi isto com destinatário especifico.
ResponderEliminarMas, sobre o assunto sempre lhe digo que ver o Presidente da Republica na televisão "a fazer a sua própria mochila" como quem parte para uma ilha deserta mas paradisíaca, não pude deixar de me espantar.
Um abraço
Eu quando vejo as pessoas dizerem que levam livros, lembro-me do Camões. A diferença é que estas pessoas não escreveram os livros que consideram imprescindível salvar numa fuga...uma grande diferença é talvez, a diferença.
ResponderEliminarTétisq, tenho de concordar que há pessoas cujos seus pensamentos são autênticas epopeias.
EliminarUm abraço.