sábado, 28 de maio de 2022

Linhares da Beira

A forma das casas baixas e sombrias pouco ou nada mudou de há cinco ou seis séculos a esta parte. Julguei sonhar quando vi através das magnificas janelas manuelinas, aqueles grupos de mulheres de olhar selvagem e linha escultural, que fiavam a sua rocada na sombra e conversavam entre si numa língua quase imperceptível. Parece que todos aqueles espectros pardacentos tinham acabado de quebrar a pedra do túmulo para executarem entre si uma cena de outra época, de que fui o único espectador vivo. A pouca vida das ruas da aldeia tem o mesmo caracter de estranheza e arcaísmo que parece fielmente copiado do modo de viver duma geração que já passou.
Não me importava nada de cá morar. Podia manter-me a papas de milho e pesto de urtigas.

7 comentários:

  1. Penso tanto nisso, em refugiar-me num lugar assim...tenho tanto medo disso quanto fascínio...e essas iguarias também me agradariam.

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    1. CC, não é preciso ter medo. Mas... a consciência vai sempre connosco.

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  2. Também lá deve haver outros sabores. Talvez as mulheres falem deles nas suas conversas, ainda que não queira ser indiscreto nem interromper a estranheza.
    Bom refúgio, ainda que breve.

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  3. Ainda é necessário ir ao café buscar a chave para abrir a porta de acesso ao castelo?
    (jamais esquecerei aquele momento de pura surpresa & delícia!)

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  4. Posso assegurar que tem francamente mais aplomb solicitar com gentileza a chave da porta (a outra), no café. E conversar sobre o tempo, as bizarrias dos voadores nos seus parapentes, o espanto dos pastores lá em baixo, em campo aberto, o tempo. Beber um café quente. Não gostar daquelas placas com o nome das ruas, talqualmente azulejaria de w.c., perceber que seria impossível viver ali a papas de milho e pesto de urtigas (o milho é sublime degustado em broa, os grãos, em salteados e, as urtigas, em sopa, esparregado :)

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