quarta-feira, 23 de outubro de 2019

A última palavra

Quantas e quantas vezes damos connosco a escutar a nossa voz perdida. Fala para si mesma, sem se lembrar de procurar do lado de fora, no longe dos espaços. Pronuncia palavras locais, onde há um desconforto no corpo, sem olhar para um além, para uma outra terra, para outras horas. Por vezes as contingências dessas palavras propõem uma involução no tempo - descida vertical da memoria presa de recordações, de rostos, de entidades queridas, de ritos amarelecidos. O tempo da história de cada um, para aí tentar encontrar as causas esquecidas dos males insidiosos e da felicidade palpável e impalpável. Revisita e questiona o tempo passado perdido no espaço do presente que ainda frui, intensamente. Quando a primeira pergunta deveria incidir sobre isso mesmo: "o que é que eu fiz"? Precedido da resposta: "pouco". Como última palavra. 

Uma cisma claramente subtraída de uma dissertação feita num jeito muito mais manso.

12 comentários:

  1. Não devemos viver presos nas recordações, não nos deixa evoluir.
    As duas últimas linhas fizeram-me lembrar a preparação para a confissão[risos], isto para aflorar a coisa, porque de últimas nem primeiras gosto. Tenho dito!

    Olá Impontual, o que é pouco?

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    1. Pouco é sabermos que ainda existe/existia um espaço complementar.
      E... insatisfeitos como somos, esse espaço nunca se completará. :)

      Bom dia, Persófone.

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  2. Incompletos como só nós, pouco pode querer dizer que há/havia espaço para mais.
    Não é assim, Senhor Impontual?

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    1. Absolutamente, NUT.
      Sendo certo que, por muito mais que vivamos, esse espaço nunca se completará. :)

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  3. Na hora do juízo final, espero que aquilo que me foi dado fazer, com o pouco de que dispunha, tenha a benevolência e a compreensão do Supremo Juiz...

    Só agora dei conta onde o Impontual se inspirou e vou ler esse jeito que por vezes é pouco manso. Contudo, estou descansada, sei que por lá tenho um "desconto".

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    1. O juízo final será seu. Terá de ser sempre a Janita a acolher a abjuratória. :)

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  4. Como vai, Impontual?
    Pois eu cá com todas as contigências que a vida me tem dado, ainda continuo a dizer "fodasssss, ainda não"
    De tudo o que o Universo me deu e foi tanto ainda me falta cumprir uma parte e sei que Ele conta comigo. Digamos que somos sócios.:D
    Uma noite tranquila, Impontual
    GG

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    1. A GG é de cá. Está agarrada a isto de tal maneira que o universo não tem outro remédio senão conspirar a seu favor.
      (muito bom o episódio da segunda vez). :)

      Bom dia agora, GG

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  5. Olá, Sr. Impontual,

    Começo por agradecer a referência. Simpático da sua parte.

    Depois quer a sua observação quer a do comentário da Janita fizeram-me ficar admirada, embora sorridente: a sério que a ideia que passo de mim é que sou brava? A sério? E eu que sou tão mansa... Já para não falar que, volta e meia, desce em mim uma espécie de espírito purificado e viro a Sta UJM.

    E depois é assim mesmo tão pessimista, Sr. Impontual? Depois de tantas aventuras, tantas mulheres retratadas, tanto livro e pensamento percorrido, tantas palavras tão buriladamente dispostas, o balanço que faz é esse? Pouco?

    Olhe, não acredito.

    Cá para mim, despojar-se-ia de gramáticas e vocabulários e seria mais isto: 'Tá-se'

    Dias felizes, Sr. Impontual

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    1. Bom dia, UJM.
      Sou eu quem agradece puder lê-la.
      Não tenho nada essa ideia de a UJM ser "brava". Antes pelo contrário. Se não repare no link que leva até si: "Uma cisma claramente subtraída de uma dissertação feita num jeito muito mais manso".

      Permita-me discordar quando diz que a resposta "pouco" indicia ou demonstra qualquer tipo de pessimismo. A palavra "pouco" neste contexto indicia claramente o quanto somos incompletos e insatisfeitos. Por muito tempo que por cá andemos, por mais tempo que vivamos, por muito que façamos, no final a resposta será sempre: gostava de continuar.
      Pois claro, ninguém fez tudo. Havia tanto para fazer ainda. Fez-se Pouco.

      Mas como não somos imortais, "tá-se".

      Obrigado por ter vindo.

      Um abraço.

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