Vem posar de dois em dois meses. Sempre no inicio do mês, sempre no inicio do dia, sempre a uma quarta-feira. Estamos em Novembro. Sabe que será severamente condenada pelo júri popular, sempre seguro da sua retaliação e dos valores que considera defender. A negligência socialmente criminosa prevalecerá, mas se puder sustentar o homicídio, não se privará disso. O júri popular não dispõe de qualquer prova de crime, mas no seu espírito, esse acto não suscitará dúvida nenhuma.
Fixo-a sem a julgar. Sei que nem é culpada nem inocente. Franzi ligeiramente os olhos. Não a absolvo. Não é a minha função. Não a amarguro. Não é o meu género. Franzi novamente os olhos. Não a interrogo. Trata-se de outra coisa que não a simples discrição. Outra coisa que não o tacto, também. Não espera de mim nada a não ser o meu silêncio e a minha presença, essa força natural.
Conservo a recordação exacta, física, da sua libertação. Foi como aliviar-se de um peso, acabar com o que não deveria ter sido, por-se em situação de dominar o seu destino, enfim. Há pessoas que levam tempo a tornar-se naquilo que são, naquilo que pretendem ser. Ela é uma dessas pessoas.
O retrato é perigoso. Preciso de fingir que sonho com o seu modelo. Apresso-me a impregnar tinta na tela. Respondo mesmo antes de a imagem emergir. Tenho ideias em catadupa. Esta viscosidade insistente não ajuda na secagem que se queria rápida.
E, amanhã já será outra coisa que não o momento petrificado no quadro.
ResponderEliminarBom texto...Gostei de o ler:))
ResponderEliminarHoje-:-Queria sentir-te na minha realidade
Bjos
Votos de uma óptima noite.
:D
ResponderEliminarGostei ☺️
ResponderEliminarDizer o quê, que o Senhor Pontual não esteja já fartinho de saber?
ResponderEliminarAssim, ofereço-lhe a estrofe publicitária que me ocorre sempre que leio «pinturas» destas:
pinta, pinta com a tinta Ro******
é a tinta que mais pinta e que mais dura
quem não pinta com a tinta Ro******
pinta, pinta, pra borrar sempre a pintura
Bom Dia, Senhor Impontual. :)