sábado, 25 de janeiro de 2020

Palomar


Na encosta subindo para nascente, onde as nuvens crescem a cada passo, o Senhor Impontual pára pela segunda vez e pela segunda vez voltou-se lançando um olhar demorado para o vale que, ao fundo, parece de todo abandonado, tão silencioso e imóvel está.
À sua volta a luz acinzentada parece consumir o próprio ar que se respira. À direita, bastou-lhe olhar para as vinhas que se estendem pela encosta até à margem do rio para sentir, como se fosse um bicho faminto sob a frescura daquele ar, o cheiro acre, saboroso, das videiras banhando-se primeiro de geada e depois do sol manso da manhã. Nesta altura não se percebe se são arbustos vivos, se empedernidos por décadas e décadas de geadas e de sol. Plantas imóveis, agarradas à terra, parecem esqueletos calcinados à espera de um vento mais forte que as arranque dali.
O Senhor Impontual está estarrecido, mas não em dispneia.

5 comentários:

  1. Descrição magnifica! Nem precisava de foto. Douro?
    É paisagem para tirar o fôlego a qualquer um. Muito mais a um romântico como o Sr. Imponttual. :))))

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  2. O senhor Impontual está num sítio muito bonito.

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  3. Que saudade imensa de nunca aí ter estado, nesse ponto exacto, e lê-lo como se estivesse :)

    Boa tarde, Sr Impontual :)

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  4. :)
    sim, às vezes, acontece, a beleza é incomensurável, antecede-nos e aquilo que observamos é um fóssil vivo, falando-nos numa linguagem da qual só percebemos através dos sentidos (e basta assim).

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