Não há muito mais a acrescentar. Um verbo (fazer), dois pares de substantivos (floresta, incêndios, cidadãos, políticos) e dois advérbios, um de tempo (agora) e outro de negação (nunca).
quinta-feira, 22 de junho de 2017
terça-feira, 20 de junho de 2017
Psycho killer (epílogo)
(...)
Duarte estava agora a aguentar toda aquela cena, completamente virado para dentro, da mesma maneira que aguentava tudo. As palavras "ainda há pouco pedias a Deus por sinais" abriram caminho pela sua mente como grotescas enguias nadando em águas pesadas cheias de algas negras ondulantes, rodopiando e redemoinhando à volta umas das outras. Agarrou com firmeza o último copo, formando com ele uma dupla compacta: solitários, sofredores em silêncio, devoradores de vidas inconsequentes. Era difícil abandonar-se, render-se. No fim do dia tinha sempre vontade de dormir sozinho. Despiu-se e encheu a banheira. Ficou de molho durante imenso tempo, folheando umas revistas que nem teve o cuidado de não molhar. Bebericou as últimas gotas de bourbon que repousavam no fundo do copo. Na boca ficou-lhe um travo a chuva. Quando sentiu que a água quente tinha cumprido o seu papel, aliviando-lhe a tensão das pernas e concentrando-a no sexo, masturbou-se, arqueando o corpo no momento crucial para romper a água e ejacular para o ar. Para espanto seu, uma gota de esperma bateu na lâmpada pendurada no tecto, com um som crepitante, projectando uma sombra trémula e fugidia.
- "Deus queira que Deus não exista, Deus queira que Deus não exista", vociferou de olhos semi-cerrados
Duarte estava agora a aguentar toda aquela cena, completamente virado para dentro, da mesma maneira que aguentava tudo. As palavras "ainda há pouco pedias a Deus por sinais" abriram caminho pela sua mente como grotescas enguias nadando em águas pesadas cheias de algas negras ondulantes, rodopiando e redemoinhando à volta umas das outras. Agarrou com firmeza o último copo, formando com ele uma dupla compacta: solitários, sofredores em silêncio, devoradores de vidas inconsequentes. Era difícil abandonar-se, render-se. No fim do dia tinha sempre vontade de dormir sozinho. Despiu-se e encheu a banheira. Ficou de molho durante imenso tempo, folheando umas revistas que nem teve o cuidado de não molhar. Bebericou as últimas gotas de bourbon que repousavam no fundo do copo. Na boca ficou-lhe um travo a chuva. Quando sentiu que a água quente tinha cumprido o seu papel, aliviando-lhe a tensão das pernas e concentrando-a no sexo, masturbou-se, arqueando o corpo no momento crucial para romper a água e ejacular para o ar. Para espanto seu, uma gota de esperma bateu na lâmpada pendurada no tecto, com um som crepitante, projectando uma sombra trémula e fugidia.
- "Deus queira que Deus não exista, Deus queira que Deus não exista", vociferou de olhos semi-cerrados
A convite/desafio do meu caro Miguel Bondurant, e não sei se agradeça ou peça desculpa, mas a quem deixo um forte abraço.
segunda-feira, 19 de junho de 2017
Trovoada seca
Funda, silenciosa, extensa e dinâmica, a tristeza umas vezes é presente outras já é passado. Hoje é cinza; ar turvo e poderoso, penetrado por densas partículas de fumo, estilhaços imaginários de fogo que furam a pele. Presente habitado por sombras, buraco que se afana no vazio. Hóspede indesejado que fomenta a impotência. Pesado tremor de incompletude, forte pontada no âmago. A memória não a conhece, mas recalca-a, depois tenta apaga-la. É nessa viagem, a demanda dos que sabem o que é a tristeza, que hesito desesperadamente em embarcar. Porém, hoje preciso ficar triste. Deixo-me na tristeza. Amanhã, vou ver se não.
domingo, 18 de junho de 2017
Modus Vivendi
Agora é hora de ajudar, não de arranjar culpados, a força da natureza é imensa e absolutamente destruidora. Depois, se quisermos encontrar responsáveis para tamanha tragédia, que ainda não acabou, teremos de ir muito fundo, mas muito fundo mesmo. Quiçá alterar todo um modelo de vida.
quarta-feira, 14 de junho de 2017
Estarolas
Toda a gente sabe que as pessoas dos blogs não podem ser amigos uns dos outros, porque as pessoas dos blogs raciocinam friamente, inteligentemente, logicamente. Não podem ser amigos uns dos outros, porque as pessoas dos blogs são irrazoáveis e ilógicas. Consequentemente, para serem amigos uns dos outros, deveriam ir ao encontro do terreno de uns e outros - o terreno do ilogismo. E isso não é para todos. E não sendo para todos, logo não emparelham, logo não podem ser amigos todos uns dos outros. Mas, logicamente, podem divertir-se uns com os outros.
terça-feira, 13 de junho de 2017
Da moleza da tarde
segunda-feira, 12 de junho de 2017
sexta-feira, 9 de junho de 2017
Primavera Sound
Inclinou-se sobre aqueles dedos tépidos subindo até ao pulso com uma caricia imprudente que lhe despertou nos olhos uma surpresa, quase uma réstia de alarme.
-- Nunca imaginei que se pudesse seduzir uma mulher só a tocar-lhe na mão, disse-lhe umas horas mais tarde, já nos braços dele, enquanto o som da tarde quente de Primavera entrava obliquo naqueles aposentos soturnos.
quinta-feira, 8 de junho de 2017
Encardido
Voltei aos jornais em papel. Compro-os, levo-os para casa, leio-os quando me apetecer. As noticias impressas chegam-me assim sem quaisquer preocupações de pontualidade, muitas vezes já apagadas, de modo que o papel amarelece ao mesmo tempo que os acontecimentos.
segunda-feira, 5 de junho de 2017
Pegada ecológica
sábado, 3 de junho de 2017
sexta-feira, 2 de junho de 2017
Por causa daquilo dos pandas bébé
O que eu gostava mesmo era poder derreter uma série de blogs que têm dentro gente incrível e fundi-los num só. Que magnifico seria a profusão de conhecimento do Caríssimo Xilre à mistura com o humor refinado de Don Pipoco Mais Salgado, com o chá da Miss Smile, com a sensibilidade da desafiante Ana, da Susana e da Laura, com a poesia da Maria Eu, com o sentido corsário da Capitã Cuca, com a profundidade nua da Flor, com o altruísmo e a musicalidade do CN Gil, com a praia da Isabel, com a voz meiga da Noname, com o romantismo intermitente do Miguel Bondurant, com o sonho inacabado da Olvido, com as múltiplas faces e tentáculos do Manel Mau-Tempo, com os atalhos da Teresa, com a esquina da Luisa... com muitos, muitos outros. No fim chamar-lhe-ia "Mistifório".
quarta-feira, 31 de maio de 2017
Pusilânimes?
Há gente cuja fisionomia muda por completo ao vê-las experimentar um sentimento vivaz, próximo do afecto. Talvez a indiferença se tenha tornado no seu território há tanto tempo e seja então um instante de emoção transparente que faz com que o seu olhar liquido não consiga encontrar as palavras que rasguem o silêncio e puxem o fio à conversa circunstancial. Ou então estão apenas a vibrar por questões rudes e pesadas de revoluções intimas em vez de se empanturrarem de incertezas. Ou então é apenas um talento natural que têm de confrontar os outros com a verdadeira medida da vida, esse talento miraculoso que as liberta das pusilanimidades que escomoteiam uma parte de si próprias.
Não sei. Mas aprecio.
Não sei. Mas aprecio.
E tu, porque ainda insistes nisto dos blogs?
A cada périplo ainda enfrento dois sentimentos absolutamente complementares: a felicidade e a tristeza retardada. Numa primeira investida, impulsiva, sente-se desde logo uma vontade abrupta de extorquir o máximo de prazer da leitura de cada recanto, como se estivesse para se dar, a todo o momento, a sua delirante destruição. Lê-se tão depressa que parece que se fundem uns nos outros e não nos detemos para destrinçar o emaranhado de histórias que se vai formando a partir dos diferentes blogs. Acaba-se sempre por entrar neles, nuns coroando todas as cenas de amor e noutros abafando todas as tragédias. Às vezes acontece ao contrário.
Há gente que sabe desenhar e aplicar tinta e que consegue fazer dela o que quer. Tem olhos para captar e pintar as coisas simples e belas da vida: a luz matinal, a superfície de um espelho, o som de uma música erudita, a casca de uma maçã, a pele arrepiada, os olhos cintilantes, os ombros brancos e esculturais, peitos proeminentes, espíritos em ebulição permanente.
Outros há que, às vezes, a nuvem vai-se dispersando, deixando um ambiente consideravelmente desanuviado, mas dai a nada ali está ela, outra vez, espessa e cerrada à sua volta a relembrar-lhes que os laços que os ligam ao mundo são extremamente frágeis. E enquanto lá fora não pára de chover, a única coisa que os impede de tentar desaparecer uma segunda vez é o medo de falhar novamente. Até que um dia, assim sem motivo nenhum, lá acordam a sentir-se bem.
Como são admiráveis as pessoas dos blogs! Mas isto, como se sabe, é só isso mesmo - blogs. O mundo há-de ser aquilo que se vê daquela janela para fora.
terça-feira, 30 de maio de 2017
Registo de propriedade
Que odeia mais a mulher? - O ferro dizia ao iman o seguinte: odeio-te porque tu atrais, mas não és suficientemente forte para me ligar a ti.
__Friedrich Nietzsche In Civilização e Decadência
__Friedrich Nietzsche In Civilização e Decadência
Ninguém atrai ninguém, ninguém se atrai a si mesmo, homens e mulheres atraem-se entre si, moldados pela sobrevivência.
__Impontual, debaixo de um terrível sol de trovada de Maio.
segunda-feira, 29 de maio de 2017
Estava aqui hesitante entre a Serenata nº 13 em Sol maior para cordas e a Serenata Melancólica em Si menor para violino e orquestra...
O problema é continuar haver pessoas que acham que temos obrigação de
ter consciência de tudo o que se passa em nosso redor. Esquecem-se, entretanto, que isso seria o
mesmo que ouvir o dia nascer, a relva a crescer, a noite a cair, a lua a passar
ou mesmo um coração distante a palpitar. E não. Não podemos estar acordados
tanto tempo. Eu pelo menos não posso.
Acabei por optar por Schubert ao piano de Lang Lang, que dize(i)s?
Acabei por optar por Schubert ao piano de Lang Lang, que dize(i)s?
Um domingo, uma chuva, uma cigarrilha...
As lágrimas são uma coisa misteriosa. A minha avó dizia-me antigamente que temos uns canais lacrimais para lavar os olhos que são máquinas frágeis e delicadas, mas ninguém sabe porque é que esses mesmos canais se põem a funcionar sozinhos quando estamos tristes. E não adianta perguntarmo-nos qual é a relação entre a tristeza e a água salgada. Embora valha a pena viajarmos pelos meandros da memória, vermos a maneira como a podemos enriquecer ou apagar, dar lugar à amnésia necessária para seguir caminho, não em direcção ao amanhã que esse nunca chega, mas ao dia seguinte.
sábado, 27 de maio de 2017
Escala cinza
Ao fundo, o mar está cinzento e liso como a curva das nuvens da mesma cor. Sento-me a observar as ondas que deixam escorregar, lentamente, as suas línguas estreitas ao longo do areal. Uma luz, ténue, de fim de manhã escapa sobre as densas nuvens negras, dardejando sobre a superfície da água, fazendo com que as ondas cintilem por uns instantes até que lambem as pedras e se tornam cada vez mais escuras, fervilhando pela areia pálida e saibrosa, desaparecendo.
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