Vem posar de dois em dois meses. Sempre no inicio do mês, sempre no inicio do dia, sempre a uma quarta-feira. Estamos em Junho e no ar paira a fragrância do jasmim, do alecrim, da madressilva e das mimosas. Os botões da catalpa rebentam nas árvores, parecendo estrelas, o seu perfume a leite-creme espalha-se delicadamente pelo ar.
Estou impedido de lhe mentir. Tudo deve ser dito, posto na tela. Observo a sua cara bonita, os lábios tingidos de vermelho pelo refresco de framboesa, a tez diáfana pontuada de sardas, o cabelo ruivo e aquela espécie de esgotamento, esse estigma da vida, apesar de toda a sua frescura. Está imóvel na banqueta, impõe a si mesma essa inércia, essa anquilose. É patente. Usa as suas feridas com elegância, com desenvoltura.
Na tela, deslizo o carvão pelo seu sorriso imperceptível. Na paleta, ensaio o carmesim que será o respingo nos seus lábios. Nada mais.