Passaram a noite num hotel de praia que no andar de baixo tinha um restaurante muito popular e, naquele entardecer de Setembro, o seu terraço com toldos e caniços estava a transbordar de gente cujo o alarido chegava aos quartos e, juntamente com as vozes e as risadas, chegava também um odor a lulas grelhadas e mexilhões em vapor.
Ela olhou-se nua de perfil no espelho do guarda-fatos e observou o baixo-ventre que ia amadurecendo sobre as ancas largas. Antes que se apagasse a luz que ainda restava no mar, estenderam-se numa cama com cabeceira de ferro que, dentro de pouco tempo, começou a gemer, enquanto na praia se ouviam canções entoadas em coro por um grupo que havia lanchado bem. Foi nessa cama que, pela primeira vez ela lhe disse que o amava e que o seguiria para sempre, para todo o lado que fosse, como uma cadela. Depois de ambos se possuírem com uma profundidade desconhecida, ficaram exaustos e suados, deitados de costas em silêncio. Por fim, ela murmurou:
- Agora recita-me outra vez aquele poema.
- Outra vez? Estamos às escuras. Não posso ler.
- Sabes de cor. Começa - disse-lhe ela de forma imperiosa.
- "Pernoitas em mim... e se por acaso te toco a memória..."