O Senhor Impontual, homem grisalho, observador treinado de oficio, de sobejo experimentado na avaliação de outras figuras, pensa à distância regulamentar: a postura, o modo de estar sentada, o rosto oblongo, os olhos biselados, os beiços húmidos de luxuria, os pés inquietos com calcanhares sobressaídos, as mãos vividas, dedos longos e arredondados nas pontas, as unhas pintadas a sangue-de-boi, o pescoço arrogante, a expressão estulta, o trejeito desdenhoso a vogar para distâncias infinitas, a deslizar por estradas já desaparecidas, mas fiel na lembrança; certamente uma evocação fabulosa e gigantesca, uma cadência longínqua. Já fora outra pessoa e, ao pensar nisso, a imagem devolvida agrada-lhe imensamente. Certas mágoas, por antigas, perderam a força de a atingir. A vida, apesar de tudo o que contém de inamistoso, nunca é importuna e ninguém vive o suficiente. Há um vago e insidioso erotismo no olhar. Um indefinível apelo a um prazer derradeiro, consentido.
O Senhor Impontual, homem moderado e incapaz de uma desobediência, coagita com os seus botões que talvez pudesse ter sido um mau rapaz. Mas não.
O Senhor Impontual, homem moderado e incapaz de uma desobediência, coagita com os seus botões que talvez pudesse ter sido um mau rapaz. Mas não.