Tenho a sensação de estar esvaziado, esgotado, roubado. Como se voltasse de uma outra dimensão, de um lugar desconhecido do mundo. Uma espécie de viagem para fora do contingente, para o exterior da terra. Como quem vive uma odisseia. Nunca senti tão intensamente esse sentimento de estranheza. Ter saído da vida comum, não para me admirar de tudo, mas para me deixar embrenhar cheio de reticências e dúvidas. E escrevo isto por saber que, seja qual for o juízo que se possa fazer, ele não surtirá qualquer efeito sobre aquilo que sou. Escrevo-o apenas para dizer ao mundo, aos terráqueos, que regresso de uma viagem de alta densidade arcaica, lá onde tudo se decide pela bitola do mais profundo. Uma história do vivente em pequenos capítulos. E o estranho é este tempo esquecido e recobrado, o de antes das palavras, de antes da inteligência, quando tudo não era senão fluxo e forças celestes. De modo que aqui têm, sou um pobre ser que acaba de transpor o grande fosso, e isso torna-me fraco. Fraco e nostálgico. Não de um paraíso perdido, mas de uma felicidade não encontrada.
Sabeis de onde venho? Dão-se alvíssaras.
Sabeis de onde venho? Dão-se alvíssaras.